Um caminho de esperança

Queridos amigos,


Alguns meses se passaram desde que aceitei o convite de caminhar desinstitucionalizadamente.

Para quem ainda acredita que eu estava em busca de vida mansa ao abandonar a pesada programação eclesiástica preestabelecida, saibam: nada requer mais comprometimento e responsabilidade na vida do que pensar, falar e fazer tudo na vida (ou seja, viver) com a Voz do Evangelho clamando na consciência dia e noite, dizendo: “Segue-me”.



Considerando apenas a caminhada interior, ou seja, aquela que ocorre no coração, longe de todos os olhares senão d'Aquele olhar que tudo vê, cada dia me vejo mais claramente, cada vez mais nu, cada vez mais exposto, mais indesculpável diante do aguilhão da verdade. Fica cada vez mais ridícula a tentativa de justificar-me diante de Deus através de performances exteriores de santidade. São nos recônditos sujos do meu coração, na sordidez dos meus pensamentos, que a necessidade da Graça de Deus para a minha própria vida fica cada vez mais evidente.

E sem a Graça, esse paradoxo lógico de Deus, onde o pecado e o Sangue se fundem gerando a redenção, tudo o que me restaria diante de tanta corrupção seria o desespero. Sem Jesus, a única certeza que minha mente carregaria é a de que o meu estado de degeneração por fim me levaria a um estado tal em que a possibilidade de não-existência eterna seria encarada como um presente de Deus. Sem a ressurreição de Jesus, o triunfo da Graça, não haveria a mínima esperança de restauração nem do meu ser e nem de qualquer coisa no universo, visto que o homem que não se vê perdoado, lança olhares de condenação sobre todos e tudo o que lhe cerca.

Mas, como diria Jó, “...há esperança para a árvore que, se for cortada, ainda se renovará, e não cessarão os seus renovos. Se envelhecer na terra a sua raiz, e o seu tronco morrer no pó, ao cheiro das águas brotará, e dará ramos como uma planta”. Nesse exato momento da minha história, é exatamente assim que me sinto: uma árvore cortada, sendo renovada ao cheiro das águas vivas de Deus! Não bastasse tal glória, há uma profunda esperança da restauração completa do meu ser!

Rom 5:2 - Pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes, e nos gloriamos na esperança da glória de Deus.

Rom 8:21 - Na esperança de que também a mesma criatura será libertada da servidão da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus.

Efe 1:18 - Tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais qual seja aesperança da sua vocação, e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos;

Col 1:27 - Aos quais Deus quis fazer conhecer quais são as riquezas da glória deste mistério entre os gentios, que é Cristo em vós, esperança da glória;

Tit 2:13 - Aguardando a bem-aventurada esperança e o aparecimento da glória do grande Deus e nosso Senhor Jesus Cristo;

Heb 3:6 - Mas Cristo, como Filho, sobre a sua própria casa; a qual casa somos nós, se tão somente conservarmos firme a confiança e a glória da esperança até ao fim.

É a esperança da glória futura! É a glória do presente que se alegra na certeza de um futuro glorioso!

E o que isso tem a ver com a desinstitucionalização do caminhar? Tudo.

O caminho evangélico institucionalizado prevê esforços coletivos para a manutenção e crescimento da instituição, do “reino visível e imediato de Deus sobre a Terra”. E um cidadão desse reino só será visto como tal, se seu comportamento for adequado às expectativas da comunidade no sentido de contribuir com a imagem da instituição. É essa lógica de análise performática que conduz uma comunidade a julgar as pessoas - não por seu caráter, demonstrado pela convivência franca e honesta com seus amigos, colegas e familiares - e sim, pelo, seu carisma, oratória e desempenho públicos. E a quantidade de oportunidades que existem para o indivíduo expor seus dotes publicamente é tão grande que, com o tempo, ele, por vezes, se torna um artista que não sabe nem mais diferenciar o que é parte do show e o que é vida real.

Enquanto isso, longe do show, o discípulo e seu mestre trilham um caminho que ocorre nas vias do do coração, pois “o reino de Deus não vem com aparência exterior”, disse Jesus. O caminhar no Evangelho prevê, antes de tudo, o crescimento do indivíduo na Graça e no conhecimento de seu Salvador. A sabedoria já nos aconselhava, desde muito tempo atrás, que "sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida." A queda da humanidade se deu primeiramente no palco da alma humana, antes de tomar forma no "comer do fruto do conhecimento do bem e do mal". E é nesse mesmo palco que a redenção do Senhor é primeiramente percebida, antes que o Reino de Deus venha a se manifestar do lado de fora, pelos nossos atos de justiça e amor, fruto de uma consciência grata pelo perdão imerecido.

O apóstolo Pedro só pode atender ao chamado de Jesus de cuidar dos cordeirinhos d'Ele após receber cuidados pessoais do Bom Pastor. O apóstolo Paulo só saiu mundo afora anunciado o Evangelho da Graça depois que seu mundo adentro foi destruído e renovado por essa mesma graça. O apóstolo João só deixou de ser filho do trovão e se tornar um filho do Amor após recostar sua cabeça e sentir o coração do Mestre. Que razão há em nós de pensar que podemos levar algo de bom para a humanidade a não ser que o nosso próprio coração se regozije no bem do Evangelho e se fortaleça na esperança da glória de Deus?

Minha esperança no presente é poder, de alguma forma, de qualquer forma, poder incentivar as pessoas a buscarem a Deus para si mesmas, para o seu próprio bem, a andar com Deus pela fé, com suas próprias pernas. Essa é a proposta do Caminho da Graça que, enquanto movimento coletivo, incentiva a caminhada de fé individual, sem que o indivíduo possa usar o movimento como muleta.

No entanto, por mais contraditório que pareça, não quero ganhar membros para o Caminho da Graça e sim, ver pessoas cheias de Graça e firmadas no Caminho. Pouco importa onde estejam desde que Nele estejam. Conosco se ajuntarão apenas aqueles que conosco quiserem se ajuntar, por acreditar que podemos nos ajudar uns aos outros num ambiente de comunhão sincera, sem segundas intenções, a não ser a intenção de que Cristo seja formado em nós a fim de que nos lancemos no mundo cheios de boas novas para contar.

Sim, tenho esperança que muitas consciências, inclusive a minha, sejam inflamadas pelo amor de Deus e que todo aquele que diz seguir a Cristo possa usar os seus braços para acolher os feridos, sua boca para proclamar boas novas aos caídos, seus ouvidos para ouvir o clamor do aflito, seus olhos para enxergar além das aparências toda a possibilidade de ver o bem de Deus se realizar sobre a terra.

O mundo, eu sei, vai de mal a pior e piorará cada dia mais, uma vez que o amor pelas pessoas e pela verdade se esfria cada vez mais. A ferida do mundo está cada vez mais inflamada e fétida. Mas eu, cheio da esperança da glória e da glória da esperança, continuarei a anunciar que há cura em Jesus Cristo e manifestar o seu cheiro sobre a terra a fim de tornar a vida sobre a Terra mais suportável enquanto ela durar.

E assim eu vou, cheio de esperança, seguindo Aquele que me diz: "Segue-me".

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Rubens Júnior,
Estação do Caminho da Graça em Salvador - Região Iguatemi
Blog: caminhosalvador-iguatemi.blogspot.com